terça-feira, 26 de março de 2013

Um MAR de contradições: a arte nas escolas da prefeitura do Rio de Janeiro

 

 

Ricardo Pereira e Dione Lins*

 

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Em 2012, com a chamada de novos professores de Artes Visuais, Artes Cênicas e Música para atender as turmas da Educação Infantil ao 5° ano do Ensino Fundamental da Rede de Ensino Municipal do Rio, acreditávamos que a Prefeitura estava finalmente implementando o ensino de Arte em todos os segmentos das escolas no município. Mas, logo percebemos que a medida se restringia a cumprir a legislação em vigor sobre a obrigatoriedade de o professor (neste caso, o PII, o qual trabalha com o segmento citado) ter 1/3 da sua carga horária para planejamento. Todos os professores – antigos e novos - foram obrigados a cumprir a carga horária de 1 tempo semanal por turma no segmento do EI ao 5º ano. Ou seja, um professor de Arte, hoje na rede, com uma matrícula pode ter até 12 turmas e os que têm 2 matrículas, até 24 turmas, caso atenda apenas este segmento. Resultado: professores extremamente cansados, estressados e desestimulados.

Ainda no início do ano (para cumprir outra Lei – a de obrigatoriedade do ensino da Música) a SME orientou colocar a disciplina música no 6° ano. Mais uma decisão tomada sem a consulta aos principais interessados – professores e alunos. Neste caso, a decisão foi revertida, pois não havia o número suficiente de professores para atender as classes nem tampouco uma explicação plausível para o 6º ano ter música e os demais anos não.

No final de 2012, a SME manda acabar com os Núcleos de Extensão, onde se incluem os Núcleos de Arte. Tais núcleos realizam há décadas trabalhos de desenvolvimento do conhecimento em Arte e produção artística. A mobilização de professores, pais e alunos destes núcleos fez com que a secretaria voltasse atrás. Mesmo assim, muitos Pólos de Educação para o Trabalho e Clubes Escolares foram fechados.

Inaugurado o MAR - Museu de Arte do Rio

Agora, em 2013, foi inaugurado o Museu de Arte do Rio, o MAR em conjunto com a Escola do Olhar. Dentre seus objetivos, segundo a secretária de educação, está o de ‘promover o diálogo do museu com a escola’.

Logo na inauguração a direção do Museu separa um dia para os professores e outro para autoridades e artistas, numa clara demonstração de que a importância dada para a arte e para a educação ficará só na preocupação com a fachada dos prédios. O prédio da escola e do museu tem a mesma altura, para que a arte não se sobreponha à educação.

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O espaço nasce com uma proposta museológica inovadora. De acordo com a Organização Social administradora, o objetivo será propiciar o desenvolvimento de um programa educativo de referência para ações no Brasil e no exterior. O MAR conjugará, assim, arte e educação a partir do programa curatorial que norteia a instituição. Ainda foi informado aos professores que, por meio da Escola do Olhar, o MAR vai atuar de maneira integrada, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação, na formação continuada dos professores das escolas da Prefeitura do Rio e no recebimento de alunos.

Segundo a Fundação que dividiu com a Prefeitura a reforma e construção dso prédios "O Museu surge com o compromisso de unir as pontas de uma cidade que renasce, a partir de seu eixo central, e se dedicar a pensar em nossa formação e história.”.

Cidadania exige que as pessoas vivam a cidade na cidade

Vivemos um período no Brasil, em que foi estabelecido pelo MEC que todas as escolas devem se tornar de horário integral nos próximos anos. A opinião pública concorda, mas novamente: os mais interessados em opinar e propor como colocar em prática esta Educação Integral estão dentro das Unidades Escolares, que por sua vez localizam-se em comunidades e bairros da cidade.

Se a escola se transformou num espaço, isolado, fragmentado, voltado para a disciplina, com uma hierarquia absurda, com pouco espaço para o corpo, a movimentação e o lúdico, e, como tal, não desperta mais o interesse de nossos meninos e meninas, como esse aluno vai aprender algo sobre arte, cidadania, ética, por exemplo?

 

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A escola não vai à cidade. A nossa escola carioca (e brasileira) não frequenta os museus (todos com excelentes setores educativos) nem os parques e tampouco as praias e praças. Todas as escolas deveriam, antes de tudo, ter acesso a ônibus para poderem levar nossas crianças para a rua, para as exposições, para os espetáculos e para os museus.

Estamos propondo, então, que nossos meninos e meninas permaneçam isolados entre quatro paredes, em um modelo de escola fragmentada e passiva?

Como é sabido, a Prefeitura não disponibiliza ônibus para as escolas, nem a Organização Social que gerencia o Museu. Os ônibus da liberdade que levam as crianças para a escola não são disponibilizados para os passeios e as escolas não têm verba suficiente para este tipo de atividade. Então, cabe aqui uma pergunta: como os alunos do subúrbio, da zona oeste e da zona norte irão fazer as visitas tão necessárias para o seu aprendizado?

Diante de tudo que o professor de Arte na escola vivencia isso é uma contradição! Para dialogar com a arte e o museu, professores e alunos precisam ter condições para um trabalho que reflita a proposta tão propagandeada na inauguração do MAR.

É preciso que todas as escolas tenham salas específicas de teatro, dança, artes visuais e música, ter pelo menos 2 tempos de aula com cada turma e essencialmente que todas as escolas tenham condições de visitar, não somente o MAR, mas todas as exposições que estejam nos planejamentos pedagógicos de todas as escolas desta Rede.

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A prefeitura deve exercitar seu OLHAR para todas as escolas, OUVIR sua comunidade e RESPEITAR cada espaço escolar, incentivando a produção artística em cada unidade e expandir a proposta dos núcleos de Arte, para que tenhamos uma sociedade voltada para a fruição e que realmente dialogue com a Arte. Precisamos criar não uma escola, que seja uma exceção no resto da rede pública, mas uma rede que seja excepcional na formação de nossos estudantes.

Ricardo Pereira – professor de arte do município do Rio de Janeiro e militante da área da educação.

Dione Lins – professora de arte e convidada da editoria Fazendo Arte & Educação.

4 comentários:

  1. Os Nucleos de Arte das escolas municipais deveriam ser fortalecidos, apoiados, incentivados! É um absurdo esvaziar essa importantíssima atividade educadora - o fazer ARTE. Como se pode conceber Educação sem Arte e Cultura??? É muito triste constatar o descaso à fundamental ação do professor de Arte no Ensino Publico. E como se pode compreender o apoio à criação do MAR e o esvaziamento dos Nucleos de Arte das escolas municipais??? Isso faz sentido??? Não será mais facil formar uma parceria com a FRM do que apoiar os professores municipais de Arte??? É issa a resposta??? Ou será que o descaso se explica por uma total falta de atenção ao importantíssimo significado do trabalho do professor de arte... A Arte amplia o olhar, o pensamente, a imaginação e a sensibilidade para a leitura do mundo em que vivemos. Uma criança ou um jovem que pratica Arte, seja ela qual for, tem seu espirito sempre cheio de vontade de dizer e de fazer! Tem vida! Nada melhor para seduzir os estudantes ao conhecimento e ao estudo do que o fazer Arte! Lamentavelmente, a SME do Rio consegue desvalorizar o professor de Arte, a ponto de esvaziar os Nucleos de Arte das escolas municipais. Isso é decepcionanto, andamos para trás.... Isso é muito ruim.

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  2. Que bacana esse texto e todos os comentários que já começam a aparecer. Essa arena do debate é maravilhosa. Vou bater sobre o já malhado: Infelizmente, as políticas públicas desejam, no fundo, trabalhar para ressaltar as ações pontuais de cada gestão. Desmantelam-se assim, organizações estáveis e produtivas, como o caso do Nucleos de Arte. Isso vem ocorrendo SEMPRE. Bacana a reação e a resistência. Essas são novas configurações políticas que estao se afirmando. É preciso que tenhamos uma associação docente AAERJ que nos representa para alem de vinculos com a SME ou SEE e que se engaje nesse movimento. Agora é hora de fazer acontecer todo o desejo de liberdade e autonomia do professor. Lembramos que o docente é um intelectual, artista, sujeito no processo - nao o unico, mas protagonista tambem. As instituições devem refletir a presença desse professor e nao achata-lo sempre visando estar com os numeros em dia. Queremos AVALIAÇAO QUALITATIVA.
    Esse lance de educação de publico de Museu esta muito proximo ao olhar quantitativo - sao o numeros que respaldam as verbas públicas de quantos visitantes /dia. Arte é que faz viver o socius e nao a coisa que esta enclausurada nos museus - o que está lá é a memoria, o traço. A arte viva esta pulsante no corpo social. Vão nos oferecer carne morta?

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  3. FINALMENTE...ACHEI ALGUÉM QUE PENSA E FALA, CRITICA NOSSA ATUAL CONDIÇÃO DE PROFESSOR DE ARTE NESTA INSTITUIÇÃO, SEM MEDO DE PERDER UNS TOSTÕES....

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