Contribuição ao debate sobre o Plano de Metas.

 
Atenção, esta charge é de 2009!  De Carlos Latuff
O governo do estado do Rio de Janeiro não vem cumprindo seu dever de casa quando se fala em educação. O próprio governador, em plena campanha eleitoral, diante aos péssimos resultados apresentados na comparação com outros estados, admitiu que o “ponto fraco” do seu governo era a educação. Apresentou, como “solução”, o Plano de Metas que buscaria melhorar os índices educacionais do nosso estado, “premiando” a categoria de acordo com o merecimento; verificado através de metas preestabelecidas nos gabinetes dos tecnocratas da educação estadual. Na opinião da categoria organizada no sindicato, todo este projeto não representa nenhum avanço em direção de uma escola de qualidade, maquiando os reais motivos da inoperância da escola pública e culpando os profissionais da educação pelo fracasso escolar. Explicaremos o porquê destas conclusões nos seguintes argumentos:
1. O governo sempre tratou o investimento mínimo na educação como se fosse o investimento máximo:
O governo do estado do Rio de Janeiro, além de ser o governo que menos gasta com o funcionalismo público no Brasil, pagando muito mal a todos os seus servidores, trata o mínimo constitucionalmente definido de 25% de receitas destinadas a educação como se fosse o patamar máximo. Nos últimos 4 anos, o investimento do governo Cabral em educação não ultrapassou o patamar de 25,1% e no último ano, não fosse a “gratificação” dada aos profissionais da educação no valor de R$500,00, este valor mínimo não fecharia. O que fica claro com os números apresentados pelo governo não é a sua intenção de investir na educação, mas sim sua vontade de, ao contrário, poupar à custa dela!
2. O plano de metas significa um corte de verbas de 111 milhões de reais na educação:
Na contramão do seu discurso, os dados apresentados pelo governo do RJ preveem um corte no orçamento da ordem de 111 milhões na educação para o ano de 2011. É necessário entender que por trás do discurso “fácil” do governo se esconde a sua prática política concreta e ela aponta para o sucateamento contínuo da rede pública de ensino. Assim, o governo do estado reafirma seu forte vínculo com os interesses privatizantes da educação, sucateando a estrutura pública reforça o discurso neoliberal de que “tudo que é público não funciona” e permite o avanço de escolas particulares que vão ter parcelas dos filhos da classe trabalhadora com um melhor nível de renda matriculados em escolas particulares. Além do que, a oferta de uma educação pública de péssima condição reforça a desigualdade social, que por sua vez guarda relação íntima com os índices de violência dos principais centros urbanos do estado.
3. Parcela significativa dos gastos com a educação acabam sendo transferidas para a iniciativa privada!
São inúmeros os exemplos de clara transferência de verbas públicas para a grupos privados, desde o projeto AUTONOMIA, onde a Fundação Roberto Marinho - “apelido” da fundação social das organizações Globo - estabelece as diretrizes do que vai ser ensinado em sala de aula, através da “metodologia” do Telecurso, toda ela voltada pra formação acrítica e uma mão de obra barata para o mercado e também no fornecimento do material didático; até os escandalosos casos de superfaturamento dos laptops ou dos ar condicionados que são alugados! O Brasil, mesmo sua constituição afirmando ser a educação um direito fundamental, deixa – a sob o encargo de grupos privados, sendo este país um dos 4 com maior participação do setor privado no ensino superior.
4. Os profissionais da educação são vistos como grandes culpados pelo fracasso da educação:
Primeiro, o secretário Risollia disse que os profissionais da educação precisavam de uma reciclagem e que sua tarefa era implementar um “choque de gestão” , depois, colocou sob suspeita o caráter de milhares de profissionais da educação e os da saúde, ao anunciar que iria contratar uma “consultoria” para rever todas as licenças médicas, como também ignorou o fato de que a superlotação das salas, as péssimas condições de trabalho, o baixíssimo salário que faz com que nós tenhamos que trabalhar em diversos lugares para sobreviver, a violência a que estamos expostos são formadores de um ambiente propício para o adoecimento real da categoria. Mais uma vez, invés de atacar os motivos concretos do problema a prática confirma a visão de que os culpados são os trabalhadores da educação. Cabe dizer aqui que a secretaria de educação é aquela que apresenta a menor média salarial dentre todas as outras secretarias do estado.
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5. Reforça a ideia da incompetência do profissional da educação retirando destes profissionais a autonomia pedagógica:
O SAERJ, o IDEB, o CURRÍCULO MÌNIMO são claros indicadores da retirada da autonomia pedagógica do profissional da educação. Além de já ter dito que, em sua visão, o educador é um “entregador de saber” e não um formulador, um conjunto de práticas e políticas que está sendo implementado na escola, reforça esta visão. Vinculando o recebimento de verbas aos índices obtidos através de avaliações externas como o SAERJ ou o IDEB, direcionam as aulas e o espaço escolar para atendimento das demandas destas provas, acirrando a concorrência e fragmentação da categoria, pois estas avaliações, no mais das vezes, não tem a mínima ponderação das muitas peculiaridades que cada região, escola e turma guardam entre si. A falta de infraestrutura na escola entra no “calculo” para a composição do “bônus”, entrando na conta do trabalhador uma responsabilidade que é do estado. Desta maneira, a escola pública irá se transformar em cursos preparatórios “PRÉ SAERJINHO”. Acreditando ser homogêneo o que é extremamente heterogêneo através da padronização da avaliação, este processo reforçará as desigualdades educacionais já existentes, pois “punir-se-á”, com o não recebimento de prêmios, os profissionais da educação que trabalham em regiões mais pobres, desestimulando justamente os trabalhadores que mais precisam de incentivo.
6. O plano de metas padroniza a prática docente e cria uma direção autoritária e mercadológica nas escolas.
Acabaram-se os debates curriculares substanciais, no máximo discutiremos os detalhes do CURRÍCULO MINIMO, mas já vêm definidas pelo governo as premissas substanciais de cada matéria: sua função, sua ênfase, metodologia, dinâmica, transversalidades, flexibilidade, relação dialógica com os educandos entre outros itens que compõem a reflexão pedagógica de um profissional na construção de suas aulas, sofrem sérias restrições com as imposições determinadas pela SEEDUC. Reforçam-se os instrumentos de coerção dentro da escola, pois se chama de “critério técnico” para a escolha de diretores aquilo que é, na verdade, um critério político: afinal, não se trata de escolher, dentre muitos, os mais capazes de dirigir uma escola pública, e sim, selecionar aqueles capazes (ou capatazes?) de implementar a ferro e fogo o “plano de metas”, sob pena de exoneração do cargo. Além disso, aumentou-se substancialmente a gratificação para o cargo de diretor, estimulando-os, mais do que nunca, para o trabalho de “fiscal do governo” invés do caráter de representante da comunidade escolar. Enquanto isso, o numero de casos de assédio moral aumenta nas escolas. Por fim, obriga esta escola a trabalhar na lógica da fábrica, controlando o tempo, o ritmo, a “qualidade” do “produto” (educação) entregue a “clientela” (os educandos).
7. O salário do docente no Rio de Janeiro é um dos mais vergonhosos do Brasil:
Em 1950, o salário médio do professor fluminense pautava o índice de 9,8 salários mínimos. Atualmente, o salário do professor do estado gira em torno de 1,4 salários mínimos, isso sem falar na defasagem que nosso salário apresenta com relação aos profissionais da educação em outras redes (Municipal, Federal e FAETEC). Cabral prometeu a incorporação do Nova Escola em 4 anos: já se passaram 2 e apenas R$100, 00 dos R$500,00 foram incorporados ao salário. Além disso, deu um auxílio transporte na forma de abono (podendo, portanto, ser retirado a qualquer instante) no valor de uma passagem de ida e outra de volta, o que não condiz com a realidade material de muitos profissionais que tomam 2, 3 ou mesmo 4 conduções para se deslocarem a seu local de trabalho; prometeu um abono cultura no mês de maio, abono este que, ate o presente momento não foi concedido e poucas pessoas tem notícias sobre ele. Investem, invés da valorização real dos trabalhadores, na política de migalhas e esmolas, obrigando muitos profissionais a buscarem a famigerada GLP, usada como moeda de chantagem quando iniciamos qualquer movimento que reclame por condições mais dignas.
8. Trocam trabalhadores por máquinas, mascaram a falta de concursos públicos e de trabalhadores em educação através do projeto CONEXÃO EDUCAÇÃO:
Ao tempo que não realizam concursos públicos para técnicos administrativos afim de preencherem os quadros de funcionários necessários para o funcionamento mínimo de uma escola, os “gestores” da educação inventaram o conexão educação que combinado com a maciça terceirização e precarização de profissionais para estas ocupação representam, para além do mascaramento destes problemas, uma afronta sobre o livre dispor do trabalho docente e, novamente, de sua autonomia pedagógica. Muitos achamos que o maior problema é o lançamento de notas online, mas este é parte (talvez pequena), do problema. Com relação aos funcionários técnicos administrativos, é cada vez menos sentida a presença deles no colégio, a ausência de concursos públicos e a falta de um plano de carreira fazem da profissão de técnico administrativo uma profissão nada atrativa e, por vezes, insalubre. Combinado a isso, percebemos o aumento da carga de trabalho destes profissionais e o ataque a autonomia do docente. Agora, o controle fabril do tempo se dispõem sobre a aula e todos os alunos, o controle, através das câmeras, também está instalado sob o teto de nossas salas e o que se percebe na pele é o aumento da carga de trabalho para todos da unidade escolar.
9. O que os trabalhadores da educação propõem?
O sindicato estadual dos profissionais da educação defende, para a educação do estado do RJ, um plano de metas diferenciado, pautado nas seguintes resoluções:
META 1: NENHUMA CRIANÇA SEM ESCOLA.
META 2: NENHUM ALUNO SEM PROFESSOR.
META 3: NENHUM PROFISSIONAL DESVALORIZADO.
META 4: NENHUM PROFESSOR SEM ESCOLA.
META 5: NENHUMA ESCOLA SEM FUNCIONÁRIO.
META 6: NENHUM PROFISSIONAL SEM DIREITO À FORMAÇÃO.
META 7: NENHUMA ESCOLA SEM ESTRUTURA.
META 8: NENHUMA EDUCAÇÃO SEM DEMOCRACIA.
META 9: NENHUM EDUCADOR DISCRIMINADO.
META 10: NENHUMA ECONOMIA NOS INVESTIMENTOS EM EDUCAÇÃO.
Cada item deste apresenta uma série de sub itens que, todos eles, só serão atingido através da mobilização e construção destas propostas. É dever agora, tanto do sindicato como da categoria, desdobrar estas metas em propostas de ação política, através da formação e do debate no interior da categoria e com especialistas da área de educação e da contínua mobilização. Cumpre papel importante neste processo o Fórum Estadual em Defesa da Escola Pública cujo direcionamento devemos imprimir para o cumprimento, também, desta tarefa, a fim de impedir-lhe o esvaziamento. Avançar em um espaço constante de formação política da categoria e dos movimentos populares, através dos debates atinentes à educação é o passo fundamental que devemos, coletivamente, construir!
Todas as charges que ilustram o texto foram produzidas por Carlos Latuff