(Jornal da Adufrj - 718 - 29/08/2011 Seg, 29 de Agosto de 2011 14:41)
“Só a luta pode garantir vitórias para a Educação”. Com essa frase, a professora Wiria Cabral*, da diretoria do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do estado do Rio de Janeiro (SEPE-RJ), sintetizou o debate “Formação e Ação Política do Professor”, realizado no Salão Azul do Instituto de Biologia, na noite de 24 de agosto. O evento fez parte da paralisação de 24 horas, deliberada pela Assembleia Geral da Adufrj-SSind, e foi especialmente dirigida aos licenciandos do Centro de Ciências da Saúde.
Wiria observou que os vários governos (federal, estaduais e municipais) investem muito pouco no setor educacional. Pior: ainda utilizam o dinheiro público em favor das empresas, como as fundações que vendem pacotes pedagógicos prontos, distantes da realidade das escolas e dos alunos. Para ela, é urgente que o Brasil aplique 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em Educação, uma das reivindicações históricas das entidades da área. O maior investimento vinculado ao PIB (hoje, o país não gasta nem 3% no setor) foi um dos grandes temas da Marcha Unificada em Brasília, na mesma data do debate (veja mais em matéria na página 4).
A partir daí, a professora destacou o processo de construção da greve da rede estadual de ensino, iniciada em 7 de junho e encerrada em 12 de agosto. Wiria lembrou que o movimento, embora estivesse sendo preparado desde o início do ano, só foi deflagrado no auge da greve dos bombeiros: “Naquele momento, o governo estava fragilizado por ter chamado os bombeiros de ‘vândalos’ e depois recuou”, disse.
A pauta da greve dos profissionais da Educação do estado reivindicava melhores condições de trabalho, 26% de aumento (após três anos sem reajuste algum), incorporação imediata da gratificação produtivista “Nova Escola” (implantada no governo Garotinho) e um plano de carreira para os funcionários, cujos cargos estavam praticamente sendo extintos pela terceirização, como porteiros e merendeiras.
Ao fim da greve, o plano dos funcionários foi conquistado, a incorporação do “Nova Escola” foi antecipada para 2013 (o governo só queria fazê-lo em 2015) e houve abono dos dias parados, além de um reajuste linear para toda a categoria, inclusive os aposentados, de 5%: “Rompemos com a lógica da produtividade”, explicou Wiria, em referência ao maior ganho, político, do movimento.
Claro que foi um embate difícil. Houve certo ponto da greve que o governo atacou judicialmente o movimento, com ameaça de corte dos dias parados: “Mas a categoria bancou a greve e até ampliou a participação no acampamento em frente à Seeduc (Secretaria Estadual de Educação, no Centro do Rio)”, disse Wiria, que também fez referência ao apoio maciço da população.
“Não há projeto de Estado que garanta a Educação. Pelo contrário, eles querem investir menos, entregar para fundações... Todo o movimento do Estado é para acabar com o bem público”, observou a dirigente sindical. Segundo ela, o enfrentamento dessa política, inclusive com greve, se necessária, faz parte de uma responsabilidade com a profissão: “Por isso, precisamos formar os companheiros das licenciaturas para essa luta. A luta educa e nos faz crescer”, alertou, dirigindo-se especialmente aos licenciandos presentes ao debate. “Essa é a nossa tarefa e a unidade é fundamental”, completou, em referência à existência do Fórum Estadual em Defesa da Escola Pública (http://www.adufrj.org.br/fedep/).
O papel do intelectual
Glória de Melo, do Colégio Pedro II, deu destaque, em seu discurso, ao professor como agente político. E lembrou que o objetivo final da classe trabalhadora deve ser a superação do capitalismo: “Não adianta humanizar o capitalismo”, disse. Também recuperou falas do sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995) e do cientista político italiano Antonio Gramsci (1891-1937) para ilustrar sua exposição: “Como dizia Gramsci, o Estado não vai prover educação popular. O Estado está a serviço do capital”, afirmou. Em seguida, citou Florestan: “O rigor científico não se contrapõe à intervenção atuante na realidade. Não há marginalização do intelectual enquanto intelectual. Mas do intelectual que toma posição”.
Em seguida, a professora do CPII passou a falar da greve em sua instituição, vinculada ao Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica), desde o dia 10 de agosto. As principais reivindicações são: mais concursos públicos; reajuste emergencial de 14,77% e contra o projeto de lei 549 (de congelamento dos salários do funcionalismo federal).
“Todo ano, iniciamos (turmas) sem vários professores; os substitutos vêm depois. E quando queremos fazer um doutorado, só sem licença ou com uma meia-licença”, criticou. Glória elenca entre as principais dificuldades da atual mobilização o receio de alguns recém-contratados em aderir ao movimento, no período de estágio probatório, e o “esfriamento” de alguns sindicalistas desde o governo Lula da Silva: “Isso nos têm impedido de alcançar 100% de adesão, mas temos 70%. E vamos chegar aos 100%”, afirmou a professora.
A palestrante classificou como a novidade desta greve a adesão de alguns colégios militares: “Os professores civis desses colégios estão aderindo à greve, sofrendo punições dos coronéis. Professores e alunos, no Pará e em Minas Gerais, estão acampando em frente aos colégios. Isso é construção de educador. A greve é uma atividade pedagógica”, concluiu.
Mediadora cita a negociação entre Andes-SN e governo
A professora Cláudia Piccinini, da Faculdade de Educação da UFRJ, fez a mediação do debate.
Para ela, na questão salarial, a mobilização da categoria é mais intensa em universidades novas e de menor tamanho. Nas instituições maiores e mais antigas, o que preocupa a categoria é a perda de direitos, especialmente no que diz respeito à carreira: “Como estudantes-trabalhadores, vocês têm que construir uma agenda de luta unificada, pois o capital se organiza muito bem. Têm que levar esse debate para as escolas. O trabalho intelectual é o da crítica”, afirmou, voltando-se para os licenciandos.
*Wiria Alcântara Cabral é ativista da Luta Educadora e participa da mesa no debate na UFRJ, em 24 de agosto, dia de paralisação em nome da campanha salarial e 10% do PIB
Nenhum comentário:
Postar um comentário