quarta-feira, 29 de junho de 2011

Sobre o Sérgio Cabral, a empresa Delta e o Eike Batista *


Freixo falando na ALERJ:

Sobre o Sérgio Cabral, a empresa Delta e o Eike Batista *


Meu pronunciamento hoje diz respeito a toda essa polêmica envolvendo a
empresa Delta, o Sr. Eike Batista e o Governo do Estado – não poderia ser
diferente.

Por formação, sou professor de História – estou Deputado, Deputado não é
profissão. Como professor de História, sempre tive muitas dificuldades em
Matemática. Para fazer contas era um problema. Eu ficava desesperado quando
aparecia assim: “descubra o valor de x”. Eu tinha pânico! E não é que isso
me persegue, Deputado? Qual é o valor de x? Isso volta à tona no debate do
Rio de Janeiro: quanto vale x? Talvez valha bem menos do que o próprio
imagina.
O cinismo, a desfaçatez, o deboche do Sr. Eike Batista – o “homem x”, cujo
valor não se sabe bem qual é – não combinam com os dados que conseguimos. O
Sr. Eike Batista gosta de financiar campanhas, mas a minha ele nunca
financiou e nunca financiará – nem a minha nem a de muitos Deputados daqui
–, então, não há problemas. Conseguimos ter a independência necessária de
que este Parlamento precisa para fazer os questionamentos.

Sabemos que o Governador, na sexta-feira, dirigindo-se à Bahia, passou por
um episódio terrível, um acidente. Todos nós respeitamos a dor decorrente
desse acontecimento brutal. É uma questão privada, que merece todo o
respeito e consideração, mas existe uma questão pública que precisa ser
apurada. Então sabendo, com maturidade, separar essas coisas, as questões
públicas precisam ser cobradas.

Foi dito aqui que se considera normal o Governador ir para a Bahia no avião
do Sr. Eike Batista e que seria normal também ele estar indo para a Bahia
para participar de uma festa de um empresário dono de uma empreiteira com
grandes investimentos aqui no Rio de Janeiro. Pois bem. Primeiro, eu não
acho isso natural. Aliás, nada deve parecer natural; nada dever parecer
impossível de se mudar, como já dizia o bom Brecht. Agora, é importante
também dizer que o Sr. Eike Batista lançou uma nota dizendo que ele empresta
o avião dele para quem ele quiser; que ele faz com o dinheiro dele o que ele
quiser e que ele não tem nenhum investimento com o Governo do Estado. Eu
quero dizer que o Sr. Eike Batista mentiu. Não é verdade.

É verdade que ele é uma pessoa muito rica - o oitavo mais rico do mundo -,
talvez venha daí a sua soberba. O problema é que o seu dinheiro não compra a
verdade ou não cria uma nova verdade, por mais que ele possa viver no mundo
das fantasias e dos grandes investimentos, sonhando com o Rio de Janeiro sem
pobres ou pelo menos com os pobres muito distantes dos grandes eventos.

Eu quero dizer que eu fiz um levantamento. O Sr. Eike Batista, o homem “X”,
de valor indecifrável, diz que não tem investimentos no Governo do Estado.
Primeiro que a empresa OGX, de petróleo, pertencente ao Sr. Eike Batista,
recebeu no Governo Cabral, de 2007 a 2010, isenção fiscal no valor de
sessenta e nove milhões de reais. Como não tem vínculos econômicos com o
Governo? Tem sim, e não é pequeno.

Depois, a sua empresa LLX Minas-Rio, recebeu também, em função do Porto do
Açu, mais seis milhões de isenção fiscal. Tem relações econômicas com o
dinheiro público, sim. Mentiu. Tem. Setenta e cinco milhões de isenção, nos
últimos quatro anos, do Governo do Rio de Janeiro. Como é que não tem?
Empresta avião para quem quiser. Que história é essa? Tem interesse público
e privado misturado. Isso tem que ser investigado; isso é grave. Isso é
muito grave.
É curioso que o Sr. Eike Batista também é doador para a campanha do
Governador Sérgio Cabral. Ele diz que ele doa dinheiro para quem ele quiser.
Ele doa dinheiro pra quem ele quiser nada; ele doa dinheiro para quem
aceita. Ele doou setecentos e cinquenta mil reais para a campanha do
Governo: um por cento do que ele ganhou de isenção. Que nobre coincidência.
A doação do Sr. Eike Batista para a campanha do Governador correspondeu a um
por cento da doação, da isenção – perdoem o ato falho – que o Governador deu
ao Sr. Eike Batista para duas de suas grandes empresas. Como não tem
interesse? Chega de cinismo.
Mais do que isso. Uma parte grande dos investimentos do Sr. Eike Batista é
feita com dinheiro do BNDES, é feita com dinheiro público. Tem milhões de
problemas trabalhistas, ambientais e sociais; está questionado pelo
Ministério Público. Tem uma diversidade de flexibilizações colocadas pelos
órgãos fiscalizadores, que poderiam fiscalizar muito melhor as suas
empresas.

Está aqui o Ministério Público Federal: “O Ministério Público Federal
verificou” – percebam os senhores – “que o projeto”, eu estou falando do
Porto do Açu, “foi licenciado sem que se conhecesse sequer o traçado do
mineroduto e que ele atingiria vários sítios históricos e arqueológicos ao
longo do seu caminho, com impacto sobre comunidades tradicionais, às quais
não foram sequer consideradas relevantes no Eia-Rima”. Conseguiu
autorização; flexibilizaram tudo. O Ministério Público Federal recorreu; o
Ministério Público Federal disse que é um escândalo. E mais, estou falando
de pareceres do Ministério Público Federal. Está aqui!
O Ministério Público Federal diz o seguinte: “os motivos seriam fato de o
empreendimento não haver sido licitado”. Não há licitação. A cessão da área
para o porto ter sido indevida e a licença ambiental dada ao empreendimento
ocorreram sem a aprovação do estudo do impacto ambiental. Não houve estudo
de impacto ambiental. É uma vergonha! E ele vem para cá dizer que não tem
nada a ver com a iniciativa pública, que a dele é só iniciativa privada, que
ele não tem investimento!?

Senhores, o Hotel Glória que ele comprou, em 2008, recebeu 146 milhões do
BNDES. Só esse investimento. Quer dizer que ele não tem nada a ver com
dinheiro público? Ele não tem nenhum problema com dinheiro público? E aí ele
empresta o avião dele para quem ele quiser? Não é bem assim a história.

Vimos aqui desmascarar a fala cínica do Sr. Eike Batista ontem. Ele tem
responsabilidade e tem interesse nas questões públicas do Rio de Janeiro. Os
seus grandes negócios passam sim por investimentos, licenças e pareceres do
nosso poder público. Então, não é boa, não faz bem para o espírito
republicano essa relação de empréstimos de aviões, de jatos ou disso e
daquilo para quem deveria ter um pouco mais de cuidado nessas relações. Não
é bom. Para o mínimo espírito republicano.

O que eu estou dizendo é que isso precisa ser investigado. Não estou
antecipando nenhum julgamento. Mas estou dizendo que isso tem que ser
investigado. Da mesma maneira, tem que ser investigada a empresa Delta.
Lamentavelmente, o líder do Governo veio ontem aqui dizer que a empresa
Delta tinha feito todos os seus negócios com o Governo do Estado através de
licitação. Lamento dizer que não é verdade. Não é verdade!

Só em 2010, Srs. Deputados e Deputadas, sem licitação, a empresa Delta
recebeu R$ 127 milhões. Só em 2010, o que corresponde a 23% do total de 2010
empenhados para a empresa Delta. Só em 2010. Era nesse evento, do
aniversário do dono dessa empresa Delta que o Governador estava se dirigindo
no jato do Sr. Eike Batista. Perdoem-me, mas essa não é uma questão privada.
A questão privada eu respeito e não temos nada a ver com isso. Mas não é
isso. É que essa agenda mistura uma questão privada com uma questão pública
seriíssima. Seriíssima!

Não é normal, não pode ser vista como normal. Não adianta dizer que só no
mundo privado de um fim de semana. Na segunda, essas pessoas continuam se
conhecendo e se encontrando. Por que a grande concentração de investimentos
em 2010, ano de campanha? Por quê? O total do contrato com a Delta,
senhores, é de R$ 918 milhões só neste Governo. Os números são assustadores.
Essas relações privadas não ficam no campo privado. Trazem uma necessidade
muito grande de explicações públicas. Públicas!

Essas relações, senhores, não são naturais. Colocam sob suspeita as decisões
públicas que envolvem dinheiro público e convênios públicos. Espero que esta
Casa exerça o seu papel fiscalizador e já estamos fazendo isso.

Hoje, um grupo de Deputados preparou um requerimento de informação, cobrando
as informações pertinentes, tanto referentes aos negócios do Sr. Eike
Batista como da Delta. E o Governador tem obrigação de responder. Essas
respostas são importantes para que possamos esclarecer que o mundo privado
realmente não se mistura com o mundo público. É o que desejamos.

*Marcelo Freixo em pronunciamento no plenário da Alerj em 22/6/11.

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